quarta-feira, outubro 29, 2003

Notícias que deviam ser notícias II

O Companheiro é uma associação de fraternidade cristã, que proporciona além de alojamento e refeições, formação profissional. Estes serviços são proporcionados, essencialmente, a grupos de pessoas cuja entrada no mercado de trabalho é complicada. Ex-toxicodependentes, ex-reclusos, reclusos em liberdade condicional, “sem abrigos”, desempregados de longa duração, etc. É por exemplo o responsável pela revista CAIS, provavelmente a sua actividades mais visível, mas longe de ser a única.
O Grupo Pró Mundo, é um grupo de 7 Empresas de Inserção, cuja finalidade é dar oportunidades profissionais a este mesmo tipo de pessoas, e usa, entre outros, os formandos que vêm do Companheiro. São empresas que competem no mercado em pé de igualdade com todas as outras, com a diferença de empregarem esta população, e a sua remuneração ser comparticipada pelo IEFP. A ideia é inserir através do trabalho, dar à pessoa a oportunidade de desenvolver uma actividade e começar a ter algo que se assemelhe com uma vida normal, e tentando que este processo de inserção tenha a racionalidade económica possível. São entidades separadas, mas na prática funcionam como uma só.

Convém avisar o óbvio. São instituições com muito pouca eficiência económica, com um funcionamento de tipo público, que nem sempre dá valor ao mérito, representam um custo para o estado, e mesmo as pessoas que por elas passam muitas vezes não lhes dão o devido valor, porque alguns em 3 ou 4 dias a estacionar carros ganham o que ali lhes pagam ao fim de um mês. E são de facto poucas as pessoas que ali conseguem ganhar a autonomia e capacidade de mais tarde prosseguirem a sua vida autonomamente, integrados na sociedade.

Tudo isto é verdade. Mas também é verdade que muitos conseguiram nestas instituições uma oportunidade para voltar a trabalhar depois de uma fase má na vida, e sair da sua situação de total exclusão, em que nem a sociedade nem o mercado de trabalho os aceitaria de volta. Faze-los sentir que ali são úteis e têm um papel a desempenhar, em alguns casos pela primeira vez na vida. Ou proporcionar coisas simples, banais mesmo, como ter um tecto e uma cama para dormir, tomar uma refeição normal, ter alguém que saiba que existem. Estou-me a lembrar de um senhor que, depois de ser internado várias vezes no hospital, só depois de ter falecido, se soube que tinha 7 filhos, porque não tardaram a aparecer para pedir o que lhe era devido. É uma história entre mil, de verdadeira e total exclusão, das que me habituei a conhecer diariamente, e que não acontecem só nos filmes e nos livros.

Como já disse, muitas das pessoas que ali passam nunca estarão preparadas para viver normalmente em sociedade. É um facto. Há casos em que duvido até que isso seja possível conseguir. Nem as empresas de inserção têm um funcionamento perfeito, pelo contrário. Mas muitos dos que ali trabalham (e entre eles alguns destes “irrecuperáveis”) dão graças a deus por terem aquela oportunidade, dão valor ao facto de poderem trabalhar, de terem onde dormir, alguém com quem falar. Ao verem o que está a acontecer têm medo... um medo que os acompanha desde que procuraram mudar a sua vida, e que vêm agora aproximar-se. Eles sabem que o mundo cá fora não os quer. No dia seguinte vai começar o regresso ao passado. Nuns casos a droga, noutros o roubo, noutros simplesmente a miséria, a rua, a solidão.

O mínimo que uma sociedade pode fazer é dar-lhes esta oportunidade. Por eles e por si própria. E revoltar-se. Revoltar-se quando querem acabar com o que representava essa oportunidade para mais de 100 pessoas.

Notícias que deviam ser notícias I

Está neste momento a acontecer algo que, pelos critérios das redacções televisivas, não será mais que uma nota de rodapé quando comparado ao drama nacional da velhota da aldeia que perdeu o marido numa rixa de tasca. É uma pena que assim seja. Está neste momento a decorrer uma conferência de imprensa em que a direcção do Companheiro se demite, o que significa na prática que este vai deixar de existir. E, por arrasto, vai deixar de existir o Pró Mundo, um grupo de empresas de inserção.
Agora que se está a perguntar de que raio estou eu a falar, passo a explicar.

terça-feira, outubro 28, 2003

Razões para ser monárquico III

Refere o Saudacoes, com razão, que já antes da Implantação da Républica havia o feriado do 5 de Outubro. Como se percebe pelo contexto, esse eu festejo. O 5 de Outubro de que falava, o que é oficialmente festejado, pretende comemorar a revolução Republicana.

segunda-feira, outubro 27, 2003

Razões para ser monárquico II

A razão apresentada pelo Complot para não ser monárquico, e que suscitou o meu post anterior, parece-me uma boa razão, mas no sentido inverso.
A mediatização em geral, e da vida privada dos membros da família real em particular, põe em causa a imagem de respeito que estes têm de sustentar perante o país. Essa imagem é o mais forte sustentáculo de uma monarquia. É portanto uma ameaça séria, e que pode, por si só, colocar em causa a própria instituição.
Curiosamente, ao olharmos para a realidade das famílias reais pela Europa, mesmo as mais castigadas pelos media, parecem continuar a merecer a confiança dos súbditos.
Dá que pensar.

Razões para ser monárquico I

Os regimes têm em geral um nível de poder mais executivo, e outro mais simbólico. O primeiro é o que mete a “mão na massa”, enfrenta e resolve os problemas em concreto que a sociedade enfrenta. O segundo é como uma consciência crítica que pretende representar o sentir do país e das suas gentes. Os EUA, com as suas particularidades, são uma excepção que vem confirmar a regra.
Passando a frente a discussão se deve ou não haver, além do executivo, um poder mais simbólico, e partindo do principio que deve, quem personifica melhor esse papel? Um presidente ou um Rei?
O Presidente tem uma vantagem essencial, que é a de a sua legitimidade vir directamente das pessoas, através do seu voto. Mas essa é também uma fraqueza. Para ir a eleições é preciso ter a confiança e o apoio de um partido, que também só o apoia se tiver razões para o fazer. Isto não implica que o Presidente esteja dependente do partido, porque ele pode ao longo do mandato acabar por ganhar legitimidade própria como Mário Soares conseguiu. Mas implica, necessariamente, que a escolha de um presidente se faz de entre várias opções e caminhos diferentes, e que uma vez escolhido os portugueses que nele não votaram dificilmente o vão sentir como seu representante.
Talvez Sampaio não seja o exemplo ideal, mas imaginemos que Cavaco Silva tinha sido eleito (e não esteve assim tão longe disso). Um pessoa com tantos anti-corpos poderia ganhar o sentir do país, como o mais alto representante é suposto conseguir?
O problema não é da pessoa, o problema está na própria lógica da eleição, que leva a que cada candidato seja uma parte do país, parte essa que se confronta com as restantes em eleições. É isso mesmo que é a democracia. É desejável, é saudável, é fundamental. Não está em causa. E é isso que fazemos quando votamos nas legislativas e escolhemos os deputados e primeiro-ministro.
O que é necessário para alguém chegar a Presidente, e o facto de numas presidenciais, no fundo, para além da pessoa em si, se referendar os governos, e qual o caminho a seguir pelo país. Tudo isto implica uma lógica que depois é contraditória com a própria natureza do cargo.
Digamos que a maior vantagem de um Presidente em relação ao Rei, é igualmente a sua grande e fundamental fraqueza. Um bom Rei representa o seu país de uma forma que dificilmente um Presidente eleito conseguiria.
Claro que, da mesma forma, nunca um Rei poderia ser governo. Mesmo depois de se apresentar a eleições para o parlamento e as ganhar. as eleições, a campanha e a própria natureza das funções de governo, fariam com que deixasse de ser verdadeiramente Rei. Ainda que assim se intitulasse, para nós seria apenas primeiro-ministro. Quanto ao papel que lhe cabe, dificilmente o voltaria a conseguir desempenhar.
Aqui normalmente entra o argumento do Dom Duarte Pio, não me parece que seja relevante. Não é essa a questão. O que estou a dizer é que a Monarquia me parece um regime mais adequado que a Republica. Daí a dizer que gostaria de instaurar uma Monarquia em Portugal vai um passo largo, muito largo, até porque uma Monarquia por natureza só é eficaz quando sentida pela pessoas.
O que me deixa poucas dúvidas é não termos motivo para festejar o 5 de Outubro.

domingo, outubro 26, 2003

Cada coisa a seu tempo

Pegou a moda de criticar o Ministério Público. Aqui e ali vão chovendo os ataques, como agora a que Pires de Lima veio fazer no expresso, com o seu estilo muito pessoal. A única atitude responsável é aquela que JPP defende: "nunca, jamais,em tempo algum, antes do fim do processo Casa Pia, por razões decorrentes do modo como deve funcionar uma democracia e um estado de direito", se poderá fazer qualquer alteração ao sistema.

terça-feira, outubro 21, 2003

Correcção

De uma leitora do Ilha Perdida:

"Bragança não é vila há pelo menos 5 séculos, é cidade desde
1464 (segundo Foral concedido por D.Afonso V), fará portanto no proximo ano 540
anos, o que faz dela uma das mais antigas do país."

Como tive oportunidade de explicar, chamar Bragança de vila foi uma incorrecção não intencional. Não pretendia ter sentido prejurativo, apenas interpretar a perspectiva do artigo, e porque não fazia sentido o empolamento que alguns que deram.

Políticos ou pessoas

A propósito do meu post anterior, diz a Carla que “qualquer facto pode ser encarado como um facto político. Não concordo quando dizem que uma acusação de pedofilia não coloca em causa um político.”
Existe uma dimensão política e uma dimensão pessoal das coisas, e o caso do Paulo Pedroso é exemplo ideal da distinção entre elas. A fronteira não é rígida nem necessariamente clara. Mas que existe, existe.
Um político é sempre e acima de tudo uma pessoa. Ao votar num político vota-se também na pessoa, na imagem e impressão pessoal que ele consegue fazer passar. A seriedade, por exemplo, é uma ideia essencial a passar. A simpatia do Guterres, a austeridade do Cavaco, a bonomia do Mário Soares, (…), foram factores não menos importantes para terem conseguido a confiança dos portugueses.
Daqui a concluir que a vida privada de um político é necessariamente um facto político vai uma enorme distância. Se o Tal & Qual fizer uma primeira página a dizer que o Cavaco tinha por hábito bater na mulher e filhos, tenho as minhas dúvidas que isso influencie a forma como as pessoas avaliam as suas qualidades e defeitos como primeiro-ministro.
Viesse a mesma manchete levantar um caso grave de corrupção, um Watergate português, e aí sim iria pôr em causa o homem como político.
Num caso como no outro, a possibilidade de o Cavaco vir a ganhar umas presidenciais estaria comprometida, mas por motivos bem distintos. Num porque se mostrou um político sem integridade, e noutro porque perderia a credibilidade como pessoa. No primeiro caso faria sentido o PSD meter-se ao barulho. No segundo nem por isso. O problema do PS é achar que faz sentido em qualquer dos casos.
Acho que a Carla não colocou bem a questão. Discordo da primeira frase, e concordo com a segunda. Uma acusação de pedofilia põe em causa um político, mas no sentido em que destrói de tal forma a dimensão pessoal do político, e ela ganha uma relevância tal (no mau sentido), que o impede de voltar a ser sequer ouvido como político.

segunda-feira, outubro 20, 2003

Novos Ventos

Já aqui falei do PS vs o caso da Casa Pia. É inconcebível a colagem que o PS, pela mão de Ferro Rodrigues, fez à situação de um arguido. Ainda para mais num caso que tem a ver apenas com o foro intimo da pessoa, e que portanto nada contem de político.
Depois deste fim de semana, com as escutas telefónicas que foram divulgadas sem ser desmentidas por ninguém, fica ainda demonstrado com o PS procurou influenciar e condicionar o funcionamento da justifica. O que é gravissímo.
Se parecia claro, fica ainda mais claro que esta direcção não irá ficar muito tempo. Se Ferro Rodrigues não sair pelo seu pé, vai ser levado a sair. Palpita-me que não vai sair por ele, até porque para isso não teria tido melhor oportunidade que este fim de semana. A escolha parece que é entrincheirar-se na sua posição contra tudo e todos, sejam as cabalas, as conspirações, ou o populismo. Quem perde é o PS, mas ele também vai perder muito.
A minha curiosidade vai para quem será o sucessor, porque não acredito que possa ser alguém envolvido nesta direcção. Um amigo meu mandou o nome do MMCarrilho, que talvez até estivesse interessado, não fosse a falta de interesse do partido.
Esperamos o senhor que se segue.

terça-feira, outubro 14, 2003

Bragança e a TIME II

A minha opinião sobre a reportagem é a que foi exposta. Segundo o Público última hora o governo não a viu da mesma forma, e vai cancelar a publicidade ao EURO 2004 na TIME. Mesmo aceitando a sua interpretação, acho uma medida muito discutível.

Bragança e a TIME

Foi com um sorriso que vi as notícias sobre a reportagem na TIME sobre Bragança e a prostituição. O provincianismo que transparecia na reacção do jornalista, que parecia evocar a indignação nacional contra uma notícia desproporcionada e difamatória que ponha em causa o bom nome do país perante o estrangeiro.
A reportagem, essa é uma entre muitas na linha do que a TIME e por exemplo a Newsweek costumam fazer. A estratégia costuma ser abordar um tema relevante seguindo um ou dois casos concretos, para daí extrair a visão ou reflexão que se pretende passar ao leitor, em vez de abordar o tema apenas teoricamente. Bragança não é apresentada como uma espécie de interposto da prostituição europeia, mas apenas e tão só como uma pequena vila escondida e perdida lá no meio de uns montes, e em que umas quantas brasileiras vieram pôr em alvoroço a vida pacata das suas gentes. Um exemplo que não vale propriamente por si.
A razão da sua escolha para a reportagem terá sido provavelmente pela (penso eu) inédita iniciativa do Movimento das Mães de Bragança. Não vejo qual o motivo de tanta exaltação.

segunda-feira, outubro 13, 2003

De novo Ana Gomes

Chega a meter pena, depois de ver a sua intervenção no Jornal da SIC deixo aqui um apelo: ALGUÉM DIGA A ESTA SENHORA PARA SE CALAR.

domingo, outubro 12, 2003

Ainda sobre o mesmo...

Se andam ou não nomes de ministros na baila, essa não é boa razão para andar a mandar nomes ao ar. E caso a Ana Gomes não saiba, a ideia de uma investigação é exactamente não se saber que ela está a ser levada a cabo.

quarta-feira, outubro 08, 2003

Paulo Pedroso II

Quem terá concebido esta estratégia brilhante que o PS resolveu seguir, em que o nosso maior partido na oposição se identifica e cola a situação de um seu militante acusado pela justiça de pedofilia. Se alguma dúvida havia ouvir Manuel Alegre a falar na revogação da prisão preventiva como um bem para a democracia, entre outros, foi esclarecedor.
Eu como já disse presumo a inocência. Mas vamos equacionar que a acusação se prova, como é? Para Manuel Alegre já sabemos que a conclusão é que a democracia deixou de funcionar.
A situação para o PS é muito simples, qualquer acusação que fosse provada contra Pedroso é porque a justiça não está a funcionar. E se a prisão preventiva não tivesse sido levantada não lhes passaria pela cabeça que se calhar havia alguma razão para ela ter sido implementada. Não. O problema era a doença que afecta a nossa democracia e justiça, a tal ponto que chegou ao cúmulo de acusar um dirigente do PS seja lá do que for.
Não tem a ver com a pessoa, fosse outro e acusado de outro crime e o problema era o mesmo. Um partido com a relevância do PS adoptar uma posição destas em relação a justiça e a um processo judicial em curso devia deixar-nos perplexos.

Joao Paulo II

E faço ainda minhas as palavras do Saudacoes. Joao Paulo II está lúcido e sabe o que faz, tem a força de espírito e a vontade de continuar a ser papa.
Tantas as vezes que se falou na eventualidade de resignar, e no entanto ele ali está e vai continuar enquanto viver.
É um exemplo.

Paulo Pedroso I

Faço minhas as palavras da jornalista da SIC: Paulo Pedroso aparece na assembleia como um herói, numa espécie de comício em que desmontou a cabala contra ele montada, e como afinal está inocente.
Eu por mim presumo a inocência. Mas atenção que o processo judicial está no seu ínicio. Foi revogada a prisão preventiva mas a acusação mantem-se.

domingo, outubro 05, 2003

PS vs Constâncio

Diz-se por ai que o PS anda irritado com Constâncio. Não é para menos, depois deste ter o descaramento de vir com a história de uma tal crise das finanças públicas que teria emergido em 2001. Alguém tinha ouvido falar em tal coisa?

Ainda o Referendo

Parece que afinal o primeiro ministro entende o referendo a Constituição Europeia como muito provável. O Presidente da República, teve de vir a correr para colocar as suas reticências, e não sei quantos "se"´s ao referendo. As vezes não consigo perceber qual o papel que Sampaio quer desempenhar. Admito que, como monarquico, não sou a pessoa ideal para perceber, mas a única questão aqui é saber se deve ou não haver referendo. Para mim é óbvio que sim. Se é dia X ou Y, junto ou separado das europeias, etc, etc, são outras discussões que embora importantes não devem ser usadas para iludir o essencial.
Faz todo o sentido que os portugueses sejam envolvidos neste debate e sejam chamados a pronunciar-se. Os "se"´s que vejo serem colocados parecem muito mais um receio de um possível resultado não conveniente ou sinal de incómodo perante um debate envolvente que alguns temem, e que só havendo um referendo irá existir.